quarta-feira, 29 de junho de 2011

O que pode levar alguém a escrever um livro? Por Evandro Daolio




A idéia de começar a escrever sobre minha vida vem de longe. Muitos amigos sugeriam que por diversas vezes eu o fizesse, quando presenciavam algum acontecimento engraçado sobre minha vida. Nunca imaginei que isso seria possível. Achava graça nas sugestões e esquecia-me do assunto logo em seguida.
Uma vez pensei em um título para o suposto livro. Não possuía a menor intenção de escrever, mas brinquei de imaginar qual seria o título se o fizesse. Sem um título acho que não teria começado. O empurrão inicial que me levou ao atual título surgiu há pouco tempo, no banho, enquanto a água fria do chuveiro caía sobre meu rosto. Em casa, tomando aqueles banhos longos em que a gente fica enchendo a boca de água e depois soltando como se fosse uma baba, (sei que você já fez isso) tentei pegar com os pés (por causa da preguiça) um micro sabonete que sobrou no chão e já ia sumindo pelo ralo. Não consegui. Como estava sozinho (sem aquele pessoal que freqüenta os chuveiros dos vestiários masculinos e vivem esperando você se abaixar para assobiarem) não vi mal em abaixar para pegá-lo.

Mas sabe... não entendo até hoje porque o box de casa, além de ter apenas um metro e meio quadrado, tem uma torneira na parede a apenas meio metro do chão e foi nela que sentei com tudo:

— Aaaaaaaaaiiiiiiiii... ai... aiaiaiai!!!!! – gritei desesperado.

A dor, inimaginável para você, foi no local que chamam de cóccix, aquele ossinho que você também tem. Veja então a seqüência: ao bater o cóccix, a torneira abriu, jogou água no resto do sabonete que já estava se desfazendo no chão, ensaboou tudo e vlapt! Mesmo de cócoras, minhas pernas foram para o ar e aquele barulho ridículo de pele batendo na água e no chão aconteceu; fora a cabeçada, para fechar o show.

Mas aposto que você se esqueceu do tamanho do box e não imaginou que minhas pernas ficaram para cima. Não imaginou que com o resto do corpo esticado no chão, fiquei preso e imóvel com a água caindo diretamente no meu rosto:

— Calma — refleti, tomando cuidado para não chamar a atenção da família.

Observei minha posição, mas não muito, pois uso lentes de contato e não dava para manter os olhos abertos com a água batendo no rosto. Corria o risco delas irem pelo ralo... Nem sequer pude pedir ajuda. Tenho mais três irmãos que iam querer fotografar antes de me ajudar.

Somente agora você pode ter para sempre em sua memória, a exata posição em que me encontrava ao pensar no título para o livro que tão bem se encaixa em minha vida.

Na mesma noite, deitado e enfaixado na minha cama, comecei a escrever...

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Evandro A. Daolio é escritor, autor dos livros "Ria da minha vida antes que eu ria da sua" Os volumes 1, 2 e 3 são hilários e essa semana foi lançado o volume 4 dessa série intitulado "Ria da Sua Vida 4 e da minha ainda mais". Conheça um pouco mais de Evandro no site www.riadaminhavida.com.br e adquira os livros nas livrarias Saraiva e Cultura ou nos seus respectivos sites.

Siga Evandro no Twitter: @Evandrodaolio

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Viram no que Deu? Por Percival Puggina



Era de se imaginar que maconheiros, traficantes, falsos progressistas, defensores do relativismo moral, partidários da tolerância com o intolerável, turma do politicamente correto, bem como seus assemelhados na esfera política onde todos gravitam, se encantassem com as mais recentes decisões do Supremo. Afinal, o Brasil está ficando como eles querem e o STF levando os descontentes a entender quem é que manda no pedaço.

Viva! A decisão sobre a reserva Raposa Serra do Sol foi um sucesso cívico: conseguiu lançar indígenas e colonos na miséria. Viva! No Brasil já se pode jogar embriões humanos no vaso e puxar a descarga. Viva! Battisti só não terá cidadania brasileira se não quiser, que qualificações não lhe faltam. Viva! Quando a Constituição Federal fala em homem e mulher enuncia apenas um estereótipo, um clichê em desuso, para representar qualquer tipo de encaixe. Viva! A marcha pela maconha é uma festa da cidadania patropi. E deve virar feriado nacional.

Li e reli as atribuições constitucionais do STF. Em nenhum lugar lhe foi outorgada a função de precursoria, de vanguarda social, incumbido de levar a nação, pelo nariz e a contragosto, para onde apontam os narizes e os gostos de seus membros. Já não falo em substituir-se ao Congresso Nacional que esse está nem aí para o que acontece, contanto que não faltem cargos e emendas necessárias à preservação dos mandatos. Raríssimas vozes se ouvem, ali, apontando os devidos limites às vontades da Corte.

Mas o que está acontecendo eram favas contadas. A partir de Fernando Henrique Cardoso, por 16 anos consecutivos, as indicações para o STF são buscadas no mesmo nicho. Embora a esquerda goste de dizer que FHC era neoliberal, o fato é que ele e Lula pertencem à mesma extração esquerdista, com diferenças apenas no nível intelectual. FHC é um Lula de salão nobre, com doutorado, ao passo que Lula é um FHC de piquete grevista e curso primário. Lula defende a cachaça e FHC, no melhor estilo da esquerda dos anos 60, de Woodstock, da contracultura, oitentão modernoso que é, defende a maconha. Aparta-os a política, não as ideias. Os indicados por ambos formam 80% do Supremo e não faz muita diferença o fato de que Lula tenha escolhido boa parte dos seus no partido e no partidão. As cabeças são parecidas. As disputas que por vezes se esboçam entre eles são, essencialmente, de beleza. Temas para espelho mágico. De nada vale, então, aguardar o futuro porque o futuro não nos reserva algo melhor. Os ministros mais antigos e mais próximos da compulsória são os dois Mello - o Celso e o Marco Aurélio. Estão piorando com a idade e com a vaidade. Gravitam no mesmo círculo filosófico dos demais. E só saem, respectivamente, em 2015 e 2018.

Viram no que deu, este país ficar votando compulsivamente na esquerda? A mesma sociedade, majoritariamente conservadora, cristã, consciente da importância dos valores tradicionais, ao votar na esquerda por motivos menores, é obrigada a assistir suas posições maiores - religiosas, filosóficas e morais - serem desrespeitadas e ridicularizadas nos votos e nas decisões dos ministros do Supremo.
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Percival Puggina (66) é titular do blog www.puggina.org, arquiteto, empresário e escritor, articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões. Puggina gentilmente nos autorizou a publicação de seus artigos.
Siga Puggina no Twitter: @percivalpuggina